sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Se amanhã não chegar


O meu amor viu a lua nascendo primeiro
Eu tão longe dela, só vi o céu nu...
Será que o amor é a mesma contradição do céu?
O nu é puro da cor da luz que você toca
Quando pesa minha presença na mesma rede
Das tarde quentes que dividiram o seu perfume
Com a maresia do seu cabelo e com esse corpo
Que lhe escreve lembrando de todo o seu contorno
Quando era a luz do fim da tarde que contornava
Seu quadril feito à mão, linha e agulha
Depois da lua, tudo é branco e lúcido
Menos os seus olhos, que me encaram como se a noite
Fosse infinita...

(Teresa Coelho)
28/12/2012

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Bilhetinho de geladeira


Eu pertenço às suas cores, que de tão soltas no mar, desabrocham o céu que pinta meus olhos. A canela vem da sua boca para eletrificar meu corpo – beijo que estremece a língua, o colo e o ar. Seu rosto sereno soa feito uma canção de dormir para os medos renascidos de uma vida oculta, trazendo de volta o que a gente esquece que é verdadeiro. Se o seu amor for verdadeiro, traz-me as flores que deixei plantadas no seu sorriso? Traz jardim, traz verde, traz vento, traz paz. Vem!

Teresa Coelho
27/12/2012 


domingo, 16 de dezembro de 2012

Nada


Quando a vida se despede do dia
As coisas findas se desprendem
De mim

Debaixo da água há sempre
Olhos embaçados
Que sorriem

 Para quem vê o rosto
De quem não sabe flutuar
 Afundar

Como se voltar à superfície
Fosse mais fácil para
Esquecer

(Teresa Coelho)
16/12/2012

domingo, 2 de dezembro de 2012

Teatro experimental de domingo


Primeira parte: Acidentalmente uma introdução

Uma casa numa rua escura, com pouco movimento e alguns fantasmas. A casa é mal pintada, velha, e, às vezes flutua no submundo dos medos – enquanto uma pessoa chora, outra pessoa está fazendo sexo com um desconhecido – apenas uma nota para acrescentar na entrada perto do portão, mas não pulemos as etapas. O portão é enferrujado, mas o sangue na maçaneta ainda está quente.

Segunda parte: A solidão é concreta

Dentro da casa revelam-se os figurantes: uma cadeira sem encosto, um colchão mofado, um ventilador com muriçocas mortas, uma televisão fora do ar, um sapato molhado, latas de cerveja, pontas de cigarro, parede derretida, luz colorida meio escura, alguns zumbis que passam no reflexo do espelho quebrado, um copo sujo de batom vermelho, uma pia com vazamento, sonhos sem dono, geladeira vazia. (Observação: percebe-se o chão um pouco fora da realidade, nascendo ao contrário do sol).

Terceira parte: Personagem de caráter patético

Posição da personagem indefinida no cenário. Sem postura, o olhar nunca é intenso, deve sentir-se olhando para o buraco de uma fechadura que, por azar, tem uma chave – certo mistério cansativo. O sorriso vai brotar quando não souber o que falar, mesmo sendo escrava dessa casa, ela vai ter que sorrir, porque a rotina emperrou sua espontaneidade. Ela tentará gritar, mas algo reprimirá seu desespero, como se incomodasse o mundo com seu jeito exaustivo de expressar o que sente.  A personagem tem um perfil comum, e sendo assim, não será preciso investigar sua relação com o resto do cenário nem tampouco com o resto do texto ou da vida. Talvez ela desmanche-se perto do colchão mofado, para que não percamos tempo com um final evidente de tragédia cotidiana.

Quarta parte: Análise sobre a mente

Não é permitida a entrada de personagens fictícios para não perturbar a autora do texto – e ação!
- Corta!
(Teresa Coelho)
03/12/2012

Casa nova


O mar acordou cinza, como se alguém houvesse ateado fogo no céu e tivesse chovido lampejos de estrelas mortas. Noite passada, o calor foi quase mortal, as únicas partes frias da casa eram o escuro e o meu coração – o frio era para ser branco. Vaguei inquietamente pelas paredes, esperando que qualquer rosto atravessasse aqueles tijolos velhos para enxergar meus olhos despedaçados. Você tira fotos de rostos ausentes; seu amor é tão distante de quem eu sou. A solidão é o egoísmo da alma? A paz é o disfarce do nosso abismo? Ninguém bate na minha porta. Que horas são? E você nem ficou quando o café esfriou, mas já anoiteceu, e amanhã poderá fazer sol.

(Teresa Coelho)
02/12/2012

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Coração antigo


Ah, se eu invento de escrever sobre meu coração antigo,
Meus olhos vão fechar-se por um pouco mais de cinco segundos,
Hei de sentir os vultos que perseguiam minhas costas.
Não sei mais por que eu rezava todas as noites,
Às vezes, adormecia no ‘’Santo anjo... ’’, às vezes, acordava
Para recomeçar tudo, como se algo de ruim pudesse acontecer-me.
Hoje, não consigo mais rezar, então penso que nada importa muito,
Porque posso abrir uma garrafa de vinho e morrer antes de bebê-lo -
A garrafa despencaria no chão, os vidros se despedaçariam,
A terra beberia o vinho assim como comeria meu corpo.
Se amanhã chover, certamente vou querer algo para amparar-me,
Ficarei enferma, o tédio escorrerá sobre a vidraça,
O frio atingirá cada poro do meu corpo,
E, raramente, alguém se lembrará de seus primeiros anos...
A alma não tem lembranças, mas há sempre algo que permanece,
Algo que fica intacto - tornam-se lembranças das lembranças...
Um lugar onde todos ainda estão vivos, seus brinquedos estão novos,
Sua mãe é algum tipo de anjo, seu sorriso floresce outros sorrisos,
Seus pés podem voar quando a solidão ainda não significa solidão.
Aprendi com o tempo aquilo que o tempo não me ensinou,
Nunca saberei quando meu coração parou de crescer,
Pois, desaprendi com a vida aquilo que o tempo me ensinou.

(Teresa Coelho)
27/11/2012

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Peito aberto


A mão fechada no peito
É a vontade de arrancar
Todas as estrelas
Que a noite já me deu
Flores azuis são
Pinturas sem nuvens
Minha alma calejada
São as noites inacabadas
Dos sonhos longos e escuros
Que eu não pude fugir
Se eu arrancar de mim
O céu do meu peito
Aonde vão parar as estrelas
Quando eu não conseguir mais sonhar?

(Teresa Coelho)
22/11/2012

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Fantasma de meia idade


O despertador toca às cinco horas da manhã todos os dias. Dalva abre os olhos e fita o teto, fica se perguntando por que ela sempre se esquece de tirar a poeira dali. Nunca conseguiu ter filhos nem um marido. Quem sabe ainda fosse virgem – ou tivesse um ventre nostálgico. Levanta à procura da sandália desgastada, que um dia fora confortável, mas hoje é automaticamente uma parte velha do corpo. Dalva fuma para se adaptar à solidão e bebe café forte para se sentir mais convencional. A meia idade já não era tão boa como antes. Os seios murchos pesam cada vez mais sobre suas mãos, eles são feitos dentro da vitrola quebrada que fica no vão escuro da música. “Por que nos levantamos todos os dias?” pergunta Dalva ainda olhando para o teto. Já são cinco e quinze da manhã, e a pobre mulher nunca teve tempo para imaginar uma vida diferente da sua. Pôr a mesa; tirar a mesa; lavar os pratos; secar os pratos; enxugar as mãos; acender um cigarro; café; jogar o lixo; tirar a roupa; tomar banho; chorar; fechar os olhos; vestir a roupa; sair de casa; calor; medo; trânsito; trabalho; café; cigarro; estresse; cansaço; voltar para casa; esquecer o pão; dor de cabeça; armário vazio; televisão ligada; vizinhos felizes; solidão; olhos vagos; rugas; tirar a roupa; tomar banho; espelho embaçado; cama; cinco horas da manhã e o teto ainda empoeirado. Temos fantasmas internos que gritam por respostas, Dalva é apenas um fantasma de meia idade, mas que se levantou, pois nenhuma resposta mudaria sua vida – a gente levanta porque a vida é muda e verídica.

(Teresa Coelho)
14/11/2012

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Quarto escuro


Já que o tempo não passa
Eu abro uma cerveja
Enquanto ela estiver gelada
Eu não estarei sozinha
O último gole sempre vem quente
Deitar pra quê?
Se o sono não chega
Deixa o mundo girar
Que se eu fico com sono
Minha cabeça esquece a dor
Deixa o chão se abrir
Que se eu tiver medo
Não vou levantar
Mas deixa o medo me engolir
Que se eu não chorar
Não vou aprender a crescer
A cerveja acabou
E o sono não chegou
A angústia não passou
Deitei e nada girou
No mais, ainda posso chorar
Ainda posso aprender
A crescer

(Teresa Coelho)
12/11/2012

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

1 2 3


O peso da minha matéria decomposta
Sopra da boca estranha a minha solidão
Um dia, dois olhos, três versos
Quatro palavras, cinco dedos, seis sóis
Sete bocas, oito vinhos, nove amores
Suspendo o dez em mais um dia e em nada
Meu peito levitou a saudade
Em fotos que reproduzem um vazio amarelado
Que entorpecem vidas sãs
Membros e números amputados
Das pessoas enterradas em câmera lenta
Na imagem borrada de mofo
E ninguém reconhece o que teria sido
O que viveu já não passaria de lembrança...
Lembranças são sonhos adormecidos
Entorpecidos?
No intervalo entre o tempo e a vida
Eu sou poesia

(Teresa Coelho)
08/11/2012

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Canção


O tempo derreteu as casas da minha infância, meus abrigos secretos e caminhos sem fim. Abri uma cortina empoeirada e, lá restou enferrujada a roda de alguma bicicleta que deixei para trás, por não saber mais equilibrar-me na liberdade. Hoje, penso que seria o tempo o culpado de levar tudo isso para longe de mim, mas dentro de mim o tempo nunca existiu. – Há bicicleta branca, casas secretas e meu caminho sem fim, como uma música que se repete.

    (Teresa Coelho)
    31/10/2012

domingo, 28 de outubro de 2012

Bom dia


Acordei com o frio à procura do teu sol de línguas
Prefiro assim: teu rosto na minha luz
Enquanto o travesseiro suga os fios do teu cabelo
Eu confesso baixinho que bom dia é um beijo nas tuas costas
Felicidade é um arrepio
Olhei-te dormindo no meu colo
E fiquei completamente arrepiada

(Teresa Coelho)
28/10/2012

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Gosto de canela


O mundo lá fora é um eco do infinito
Vou soltar balões no seu quarto
Eu posso esperar você
Suas mãos tão pequenas e caladas
Engolem meu fôlego
Mas eu não me importo
Não sei falar coisas bonitas
A vida (a)pareceu tão bonita hoje
Porque ontem lhe conheci
Posso falar como é o som do seu riso
Mas ele é o segredo do meu sorriso
O mundo aqui dentro é o infinito

Teresa Coelho
23/10/2012

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Vácuo


Meu coração cansou de sentir-se velho
Gostaria de pousar mais vezes em mim
Sentir meu corpo como um objeto mortal
Ou escaldar meus sonhos com uma peneira
Abstinência de paz como um escudo
Para privar-me de novas angústias
Olho o espelho refletindo a parede fria
Se eu fosse uma parede nunca iria fazer mal
A ninguém, a nada e nem a mim
Qualquer um poderia desmoronar-me
Qualquer um poderia construir-me
Eu quero virar pó e ir embora com o vento

Teresa Coelho
16/10/2012

Tarde verde


O sono me traga para dentro da areia morna
A onda verde que vem do mar traz o peso do céu
O sal da água é só a lembrança da tua língua no meu corpo
O mar pousou forte nos meus pés
Como o frio na barriga dessa tua presença
Tua saliva é calafrio silencioso
Feito o mar que afoga sem a gente sentir
Me afoguei em ti 
Quando vi a onda se desfazendo na areia... 

Teresa Coelho
13/10/2012

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Sol, lágrima, amarelo


Eu só me pergunto onde
A luz que toca o mar dorme
Enquanto ninguém a vigia
Os últimos raios que eu não pude ver
Escondem-se atrás
Do amarelo salgado do sol
Abaixo, as nuvens travestem a alegria
Que nossos olhos enxergam
Mas a luz não termina
Quando estes últimos raios
Tocam o mar
Fecho os olhos
E na minha alma
O sol está nascendo
De novo

(Teresa Coelho)
08/10/2012

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Pequeno voo


Pássaros é a poesia das entrelinhas
Do azul que escapa ao olho nu
Descanso no seu ombro como se
Metade da paz que eu escondo
Fosse por inteira minha morada

(Teresa Coelho)
04/10/2012

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Os pássaros mortos daquelas putas


Ironia são os pássaros que cantam na janela de uma prostituta, que com os cabelos desgrenhados e a maquiagem vencida, mantém intocada a postura de seu corpo marcado pela dor do ventre imundo. No verão de 1978, nascia no quarto daquela puta o canto dos pássaros. Como podia a fé nascer de fora para dentro de um sonho vazio? Quando a noite chega, a fé só passa de um filme bom, mudo e falido. À noite, os pássaros dormem, e a puta canta... O sorriso é o passo em falso que ela não pode dar. No inverno de 1994, os pássaros, subitamente, pararam de cantar, mas a puta, ela continuou cantando por todas as noites daquele inverno.

(Teresa Coelho)
25/09/2012

domingo, 23 de setembro de 2012

Vertigem


Um bêbado reconhece
A cama vazia
Quando os pés
Ainda buscam
Os lençóis frios
De uma noite
Que findara
Há anos
A morada do bêbado
É o passado
Tropeços vagos
Que embalam a memória
Com papel alumínio
Enquanto o bêbado
Finge que dorme
Os pés ainda vivem
O que hoje é só
Frio e solidão

(Teresa Coelho)
23/09/2012

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Confissões de uma sombra


Quando acordei, o dia já raiava quente no meu rosto, as pontas dos cigarros, as cervejas quentes me encavaram da janela. Achei que você tivesse voltado, achei que tinha ouvido sua voz – procurei qualquer mentira para me levantar da cama. Noite passada, eu confessei para uma estranha ‘’só faço poesia quando me apaixono’’, descobri que já tinha me apaixonado pelos olhos verdes dessa estranha; outra vez, me apaixonei pelas patas do meu cachorro, pela solidão de minha avó, pelo sexo dos loucos, pelos meus amantes, pela minha culpa, por cada pedaço quebrado do meu coração, por suas despedidas. Fiquei remoendo minhas paixões durante toda a manhã, enquanto engolia a seco minha saliva, minha ressaca, minha dor. Lamentava o valor de ser este corpo cheio de vícios, tão vazio e promíscuo. Aquele acordar suave já não fazia parte de minhas paixões – abrir os olhos era um tipo de esperança clichê. Depois de horas pensando em como levantar, em ir adiante, virei meu corpo para a parede, fitando o branco, dormi de novo. Só acordei quando o sol parou de fingir que iluminava alguma coisa dentro de mim. E no mais, cansei de lhe esperar.

(Teresa Coelho)
06/09/2012

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Instante


Minha ilusão
Foi acreditar
Que todo florista
Gosta de flores
E que todo passado
Vai embora
Que todo sorriso
Tem um motivo
Mas se eu juntar
Flor, passado e sorriso
Essa ilusão
Foi só a minha vida
Que passou.

(Teresa Coelho)
06/09/2012

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Eu, a foto e o fantasma


Havia uma garota encostada na parede
Fotografando o seu seio pequeno
Enquanto olhava para mim
Ela sorria sem saber que eu estava ali
Sempre tão vaga e doce e ausente
Oscilava os olhos para a lente da câmera
E para minhas mãos
Mas por que diabos para as mãos?!
Se eu tinha um coração batendo forte
Esperando ser notado
Fotografado...
Era um tipo de desencontro suave
Uma falsa timidez de gestos programados
Quando a vida naquele dia começou a ser notada
Ela vestiu o casaco
Derreteu o sorriso, tornou-se presente
Olhou-me nos olhos e deixou cair as fotos
Quando dei por mim
Acordei na cama
Segurando meus seios, olhando para minhas mãos
Evitando ser notada
Pois já não havia mais nada
Que não fosse
Eu mesma

(Teresa Coelho)
31/08/2012

Aqui perto


Mãe, escuta-me de uma só vez
Eu fui caminhar na rua deserta
Fiquei pensando apenas no seu colo
Mãe, eu chorei na calçada de casa
Esperando você abrir a porta, e gritar:
- Não dói mais, filha! Levante-se daí!
Ô, mãe, eu fui dormir sufocando os travesseiros
Pensando na sua mão alisando minhas costas
Por favor, fala baixinho agora:
- Minha Flor, vai passar, vai passar...
Qualquer coisa para amparar esses soluços!
Qualquer calma, qualquer calma...
Esse seu medo dói mais mim, rasga mais em mim
Do que no seu orgulho de mãe
Pensa em mim...
Essa angústia parece não ter mais fim
E eu não consigo mais dormir
Sem chorar por mim
Sem você

(Teresa Coelho)
30/08/2012

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Recomeço


Falta a introdução da minha vida
Que nunca caberá na primeira linha
Da primeira folha do primeiro livro
Pois como o amor já não há de se debater
Jogo minha tolice no primeiro sorriso do dia
Eis as comparações do meu preto e branco:
É como fitar no escuro uma parede branca
E desafiar a morte quando se está morrendo
Cravar no peito aberto outro coração parado
Encarar os olhos cerrados de um defunto
Peneirar a água suja que escalda o corpo
Fixar o vulto da alma nas coisas práticas
É como voltar para você quando eu já me bastava.

(Teresa Coelho)
28/08/2012

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Levando


Meu coração mendigo
Finge que é rico
Pra te comprar
Sorrisos à prestação

(Teresa Coelho)
20/08/2012

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Cenário


Ah, meu bem
O amor
Esse sentimento
Travestido
De egoísmo
E solidão
Fez-te
Adulto sem asas
Perdeste teu amor
Na mesa
De um bar
O último vulto
Foi a Ilusão
Petrificada
Nas tintas
Desses poetas
Tolos

(Teresa Coelho)
15/08/2012


terça-feira, 14 de agosto de 2012

Ah...



Ah, esses teus olhos,
Que engolem minha retina
Para dentro
Desse teu verde
Calafrios...
Ah, essa tua boca,
Que cala meus suspiros
Para dentro
Dos nossos corpos
Suados...
Ah, tu,
Que se alastras
Por dentro
Dessa minha bagunça
Tua...

(Teresa Coelho)
14/08/2012

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Pequena comunhão de sentimentos marginalizados pela dor:


-o teu reflexo, aonde foi?
-pro espelho
-é longe?
-não lembro
-tem vida?
-parece um vulto
-a gente sente?
-transborda
-vai arder?
-feche os olhos...

 Quebra-se um espelho.

(Teresa Coelho)
10/08/2012

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Fotografia


Fez do círculo que ardia em chamas, o seu único encanto: perdendo-se o fim e o começo. O feitiço da vida é não saber onde ela começa, nem onde termina. Círculos, círculos, círculos. Vida.

(Teresa Coelho)
09/08/2012

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Ana


Marchavam a caminho da cova acompanhados pela luz do sol, e o que sabiam daquela luz, era o fardo do corpo que carregavam já sem vida. Descalços, os pés ruídos pela terra seca, as bocas fazendo-se mudas em prece, em vão, abriam os olhos suplicando por qualquer gota d’água que caísse enxurrando a dor. Ana tinha doze anos quando descobriu que além daquele fardo, também havia uma alma infida. Com seus pés pequenos, a pele morena avermelhada, cheiro de mato e sorriso no canto do rosto, desenfreou para fugir de milhões de pernas que pisavam sua pequena existência. Ela corria, e corria, e corria, e corria... buscou todo o fôlego na vida que acabara de ser descoberta. Pousando as mãos no rosto, jogou-se com toda sua força para dentro de si. Impacto. Silêncio. Mergulhou num poço, e a água a invadiu como se fossem centenas de facas penetrando os espaços vazios e rachados de todos os seus sonhos – sonhos afogados. Ana adormeceu com uma flor que boiava acima de suas costas. A flor seria então, sua vida separada de seus sonhos? Ela nunca acordou para descobrir.

(Teresa Coelho)
06/08/2012

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Última tarde de julho


Enquanto discorro meu corpo na incerteza desses afagos, o verde dos teus olhos bebe cada copo da minha angústia, como se a sede fosse um pretexto para me afogar nos teus goles. A última tarde que encontrei o sol, tua pele tremia dentro de mim, teu cabelo gemia nas minhas mãos suadas, vi o teu rosto se desfazer para pintar de verde o chão onde dormia nossa valsa muda. Dois desconhecidos se encontram na mesma esquina que separa o destino do amor. O sol ficou verde depois dos teus olhos, e o meu chão, completamente embriagado.

(Teresa Coelho)
02/08/2012

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Estante


Perco tudo
No mais
Calo-me
Como livros
Empilhados
Mofados
Esquecidos
Nunca lidos
E se me acho
É como abrir
Um livro vazio
Com uma assinatura
Anônima
De um coração
Empoeirado

(Teresa Coelho)
30/07/2012

quarta-feira, 25 de julho de 2012

O contrário do mesmo


O avesso do mundo seria o seu sorriso invertido para dentro de mim. Poesia em silêncio faz cócegas. Coloque suas pernas viradas para o céu, não deixe que as nuvens entrem no seu ouvido – é poeira mágica que embaça o coração. O mundo pelo avesso é soltar balões e ir buscar no quintal de casa. Parece tudo tão mais fácil quando eu corro sobre a poeira branca e encontro a tinta embaixo dos pés, é como repintar um lugar onde não há casas, só rostos esperando por um novo sorriso, e o mundo pelo avesso. Vice-versa.

(Teresa Coelho)
26/07/2012

Última estação


Meu olho é de vidro e ilusão
Cacos de ilusão
Penetram a retina
Afugentam o sangue doente
E escorre pelos meus seios
Escondendo de tuas marcas,
O tempo
Às cinco horas da manhã
Peguei um trem voltando
Perdida na única noite
Que pude despir o céu
E quando o sol apareceu
Já não fazia sentido
Brilhar, queimar...
Sua luz era o que faltava em mim

(Teresa Coelho)
26/07/2012




domingo, 22 de julho de 2012

Maria


Naquele quarto frio, teus lábios se fizeram de quina para uma esquina cega. Explodi na tua boca, enquanto o tempo levava minha voz para longe da tua casa de vento. Cerro a lembrança de tuas costas como um movimento contínuo de olhos vedados à procura da luz branca, que une todos os músculos à alma. Estado líquido de espírito, estado ausente - estar ausente. Sobras de um coração sorrateiro e restos de luz, que o final da tarde interrompe para projetar a ilusão do pôr do sol e dos beijos em farrapos. A Maria do quarto frio tem a desordem de sua vida como uma porta que nunca precisou ser fechada, pois era livre por dentro.

(Teresa Coelho)
22/07/2012

quinta-feira, 12 de julho de 2012

As cores de Sofia


Sofia enfeitava os cabelos sem saber o que amadurecia no toque de suas mãos. Naquela manhã fria, ela sabia que sair do quarto desmancharia seu penteado – alguém iria descobrir o quanto ela esforçava-se para não demonstrar sua feiura. Pobre Sofia, tão feia, que não sabia sorrir. Quando deitada na cama, o mundo parecia girar só para si, as cores surgiam dos olhos como um choro num grito trépido. Cansada de ouvir tolices sobre o amor, o perfume, a companhia e a lealdade, decidiu trancar-se num mundo cru – o cru e a poesia suja agora eram sua verdade. ‘’Quem precisa de beleza quando se tem um coração doente implorando por solidão?’’, era o que Sofia repetia olhando para o teto, tentando devorar o choro, enquanto percebia-se, mais uma vez, sendo devorada pela vida.

(Teresa Coelho)
12/07/2012

sábado, 16 de junho de 2012

Fantasma


Moça, você ainda não se foi, moça?
Vá embora, vá
Estendi seu vestido branco e verde dentro do escuro
Está tarde para recordar, moça
Sei que você não me ouve
E eu nem mesmo existo, moça...
Olha, tocarei em sua porta dia desses
Só para olhar de longe
O feitiço da sua pele
Prometo não levar flores nem vou lhe acordar
Mas acorda, moça...        
 Ô moça,
Você ainda me dói!
Deixe estar
Fique apenas com o as flores
Adeus.

(Teresa Coelho)
16/06/2012 

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Noite

Desde o primeiro rompimento
 Entre as peles secas
Na saliva, nas unhas e nos músculos
O desassossego de duas almas
Amando-se no desencontro do tempo
De encontro ao mesmo sexo
Destravam os gritos dos corpos
Fotografando o nu em fogos de artifício
Numa única cena de todos os demônios
 Expurgados da carne
Como arrepios nascidos dos dedos...
A noite come os delírios
Que a minha poesia geme.

 Teresa Coelho 13/06/2012

terça-feira, 5 de junho de 2012

Perdoe-me a confusão

Tentei pedir perdão pelos dias que acordei e não coloquei meus pés no chão, mas havia tanto engano e tantas palavras que me separavam de estar viva, e sobre meus pés. Pedia todas às noites para que o céu não fosse infinito como dizem nos livros; era tão insuportável imaginar algo que não tivesse um fim, doía-me a falta de ar, no mais, o sono sempre conseguiu ser maior que o céu e qualquer outra coisa que desviasse meus sonhos. O sono às vezes parece aliviar esse cansaço precoce de preocupar-se com tudo, quando se é criança. Todas as vezes nas quais o chão tocou-me os pés, percebi que aquilo era concreto, e voar já não seria mais interessante, porque ao tocar o chão, senti em mim muitas mulheres esperando seus pássaros serem soltos. Que triste é atirar-se mulher sem ser, nem que por um dia, milhares dela! Arrependo-me por esta noite de não estar sentada num canto escuro, confessando minha angústia com o peito nu, soltando pássaros que querem andar. Teresa Coelho 06/06/2012

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Oco

A solidão que desenho nas tangentes dessas linhas é emparedada e livre. Sinto-me à beira de mim mesma – tornei-me um abismo dentro do mundo. Quando despenco sobre tuas costas, é quase insustentável existir; sublimo. Mas tu gritas palavras às farpas e rasga meus olhos como se não fossem tuas, essas lágrimas. A mesmice dessa vida é um golpe solto em vários lugares, com a mesma dor. E é só, pois não posso escrever sobre o que ainda não aprendi a sentir, por isso, mentir seria como desemparedar a solidão de mim deixando-a livre, e apenas livre já não seria mais solidão. Teresa Coelho 16/05/2012

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Traço

Minha solidão veste púrpura enquanto maquia sua cor real no canteiro do meu sorriso. Ultrajo a cor do sol para poder desaparecer despercebida no fim das tardes. A aurora de meu despertar é um relógio parado, desencontro fantasioso com o tempo. Acordar é fantasiar o tempo. Mas o rastro que deixo nesse caminho pequeno é maior que minha solidão, e agora eu já posso caminhar sozinha. Teresa Coelho 20/04/2012

sábado, 31 de março de 2012

Engano

Meu orvalho é um galho seco
E a flor que caiu no meu peito
O vento engoliu
Engoliu flor
A flor engoliu o vento
Mas a flor que engoliu o vento
Não sabia que era oca
Era oca, pois a flor
Porque de tão vazia
De tão vazia...
Só tinha cor
E o que restou da flor,
Que não sabia engolir vento
Foi aprender a tragar da sua cor
Que só o vento pode engolir
E mesmo que no mundo tudo se engula
O meu orvalho continuará seco
E a flor oca
Cor.

Teresa Coelho
31/03/2012

segunda-feira, 12 de março de 2012

Do outro lado não tem luz

Eu sei que havia o outro lado, intacto. Sempre haverá o outro lado, e eu nunca vou enxergá-lo – a gente só se preocupa mesmo com a parte vazia. Sinto fome e não alcanço minha boca, sinto que estou dormindo, e se eu acordar, o mundo todo vai desistir de mim. Minha libido ficou oca, só meus olhos umedecem e gritam... Eu sinto uma urgência em tudo, em tanta coisa desnecessária, na pele que ficou incrustada nos espaços despercebidos, naquela poesia suja, e quando lembro que você faz falta em cada parte do meu corpo, sinto vontade de me arrancar dos poros ao sangue, até me desfazer do que eu era, do que você tocou. É assim, é que a vida vai seguindo, mas eu vou me apagando, sumindo, desistindo. Ninguém pode ver o outro lado, se ele não existe mais. A escuridão sufocou a luz do meu palco mesmo antes de você sair pelos fundos desse espetáculo falido.

Teresa Coelho
12/03/2012

sexta-feira, 9 de março de 2012

Essa coisa mofada

Eu me vejo no espelho e quase não sinto o tempo passar, mas escorre na minha veia alguma coisa mofada, e me sinto amarga como se tivesse envelhecido décadas antes de ter nascido. Eu nasci com uma parte torta, machucada. Vou ser sempre uma criança machucada de mãos dadas com uma canção triste. Por dentro há um êxtase de expressões, por fora, só um rosto feio e distante. Um falso amargo de um falso tempo, de uma falsa e interrompida felicidade. A carne é falsa, a pele é crua, é cru o sorriso, é falso quando eu corro à procura de mim. Procuro no reflexo vazio o brilho de alguma coisa, no fim deve haver a essência dessa coisa... Mas que coisa?! Eu sempre cito essa coisa perdida em mim, e eu nem sei se ela existe mesmo. Deve ser só mais uma desculpa para os meus lamentos. E no final, essa coisa termina sendo eu e todas as pessoas que perco na vida. Abrigo a esperança daquilo que nunca vai acontecer. E assim como esperar, escrever, para mim, é como nunca sair de um papel em branco.

Teresa Coelho
09/03/2012

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Triste fim do azul sem céu

O amor é esse escárnio que sempre acaba rompendo meu âmago. Eu não consigo seguir um fluxo que me liberta, desde que você deixou um gosto amargo em tudo que já lhe escrevi, sinto você de fora para dentro em minha vida. Sua menina do amor azul derreteu o céu, amassou os ossos das nuvens e descobriu que elas eram livres; o azul se foi e ficou o branco, o pardo, restando esperar algum pássaro que gritasse e colorisse mais uma vez a mentira sobre a dor. Ainda sinto os fios do seu cabelo costurando meus olhos na fantasia que acobertava nossas fugas, e de todas essas fugas, eu nunca mais encontrei o caminho de volta nem tampouco percebi que você já tinha ido embora. Você se foi com o sorriso que um dia foi meu.

Teresa Coelho
26/02/2012

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Batom vermelho

Eu fui parida sem a parte do sêmen, por isso nunca conseguiram me deixar bonita esperando a vida sem dor. Ninguém escolhe a solidão que carrega dentro da infância. Hoje eu choro porque nunca me ensinaram a falar, porque meus olhos me encaravam no espelho e eu não podia desabar, me obrigava a passar o batom vermelho nos lábios pequenos, embaixo da cama, sem fazer barulho, sem usar espelhos. As lágrimas não deviam borrar meu batom, não deviam revelar meu rosto perdido. Eu chego perto das minhas bonecas, e elas são tão feias, mas são minhas, contam o que me reflete. Uma vez disseram que os bois viriam me pegar e iriam machucar, mas outro bicho me machucou, um bicho igual a mim, e ainda dói, ainda dói porque eu não soube falar, eu só chorava... Por culpa dele meu batom vermelho borrou, escorreu feito sangue no meu corpo virgem e feio. Tento fugir dessas ausências criando pessoas que permanecem ocupando os espaços vazios e costuram meus versos como uma desculpa por existir. Mas esta noite terminei de limpar o batom vermelho que um dia desfez meus sonhos.

Teresa Coelho
14/02/2012

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Pros meus olhos

Guardar o teu cheiro dentro do meu sorriso. Guardar em segredo o teu sorriso.

Teresa Coelho
08/02/2012

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

É só

Sempre procurando um bocado da vida que eu compartilho nessa imensidão imaginária. Aqui dentro, bem dentro de mim, já não existe mais o verde; perdi-me ao buscar as memórias esquisitas que formaram minha vida. Nunca aprendi o que sentir quando estou feliz. Ela nunca compreendeu que eu só podia oferecer meus sonhos embaçados e minhas mãos pequenas como solidez. Eu não sei mais o que fazer com a sobra dessas noites sem amor, eu não sei mais o que fazer. -Memórias esquisitas da minha infância, sonhos embaçados e mãos pequenas, eu penso nessas coisas, e acho que vai ficar tudo bem amanhã, mas não vai.É como descolorir uma cor que não existe.

Teresa Coelho
31/01/2012