não consegui sair de casa
estava tudo quente e muito vermelho
liguei pra terapeuta desconcertada
porque a culpa era minha
a dor incrivelmente estável
dessa vez quis muito
verdadeiramente
cancelar a terapia e a sanidade
mas porque sou covarde
continuo estável
precisei transferir pro rosto dela
todos os espelhos humilhantes e
masculinos
sem performance
separei a humilhação como o ato
que deveria ser contado para quem
não estivesse presente
entendi mais uma vez que meu rosto
é um estranho
imprevisível
o desconhecido
eu acharia bonito
muito bonito se esse
rosto
não fosse real mas
uma narrativa sobre a cura
mas ele continua a insistir
que não era para estar aqui
e pede para que eu repita
como se fosse uma câmera
decisiva
"este rosto não é meu
este rosto não é a minha narrativa
este rosto aparece apenas
como um reflexo que me dizem ser
a realidade"
a terapeuta estava apressada
olhando compulsoriamente
pro relógio que determinava
o tempo que eu poderia
confiar em alguém