sábado, 30 de janeiro de 2010

O Gosto das Cerejas

Eu não pude evitar, eu nunca quis evitar. Eu sempre soube. E saber foi ter na vida um poder de culpa. A partir de hoje eu me abandono, e quem abandona, jamais terá paz até reencontrar o que se deixou ir. Sim, eu sei. Mas eu permito me amargar mais um pouco no fim dessa madrugada... Eu não senti mais o gosto de cerejas, eu queria ter o gosto delas, não o gosto que a gente sente, mas o gosto que elas sentem. Eu poderia me abandonar todas as noites, que não iria mudar o motivo desse abandono, porque ele não existe. Ele não existe enquanto você também existir dentro de mim. Nenhum vazio vai me cobrir como a sua ausência me cobre, nenhuma palavra vai mexer tanto comigo como a sua indiferença mexe, nenhum motivo me fará mais amor, do que você. Desde que você saiu da minha vida, eu nunca mais comi cerejas, na verdade, você nunca entrou. E no momento que eu me deixo ir, no momento que me deixo ser, a liberdade de nada não funciona. Eu deixei tudo que existia de bom em mim, ir com a sua felicidade... Eu mantinha você todo o tempo dentro da minha alma, ninguém podia te fazer mal. Mas você foi embora, e como numa história estúpida de corações partidos, eu paro por aqui de falar sobre nós. Uma coisa que nunca houve entre mim e você: um começo.

(TERESA COELHO)
26/01/2010