eu teria que flutuar sobre algum
fio elétrico do espaço para desconstruir
estes últimos meses. um único fio.
aquele em que paralisariam os circuitos atmosféricos pelos nervos de nossos
destinos. um fio de cabelo morto no travesseiro de alguém que nunca vou
conhecer. o fio da agulha que aperta os dedos envelhecidos da minha avó anos-luz
de minhas mãos. o fio da cortina que abriga as cores do sol de meu sono e os
animais surrealistas de oito patas e fendas mortíferas. as últimas horas desde
que nascemos perdi todos os meus amigos como se fossem partículas desconectadas
de um filme em preto & branco esperando o mute infinito. um fio em que reunissem todos os erros cometidos depois
de não poder mais atravessar as ruínas do perdão. duas mãos que se soltam
suadas como se a timidez fosse presságio para os dias felizes. duas mãos que se
soltam suadas como se a distância fosse a espera do fim. um velho que não podia
andar me parou em frente à sua casa para dizer que finalmente conseguiu afastar
as folhas que impediam a passagem das formigas. o fio de centenas de formigas
marchavam em direção à lua enquanto o gigante sustentava o céu com suas muletas. e que todas as passagens labirínticas de meus dias sejam o fio da única despedida - antes que tudo desapareça de novo.
(Teresa Coelho)
30/09/2014