quinta-feira, 22 de abril de 2010

Dentro de Mim

Um dia nascera de dentro de uma menina duas pessoas. Um homem e uma mulher. Essa menina não tinha cor, nem nome, nem idade, nem família, nem corpo. Não tinha nada; era como um subconsciente ou qualquer espírito vazio. Mas havia criado duas vidas. Para ela ninguém passava de roupas ambulantes ou seres vegetativos. Sua simplicidade era de ser nada. Ser tudo é ser nada. Quem sabe talvez um pouco de cordialidade ou um pouco de teatro para firmar compromisso com aquelas duas criaturas que agora faziam parte dela.
O homem se manifestou dentro do daquele pequeno corpo como um meio mais animal de viver. Era preciso satisfazer aquele canibalismo. Ele invadia as suas vontades mordendo, arranhando, maltratando o corpo. Parecia não querer suportar o fardo da inocência e daquela bondade superficial de querê-lo dentro de si. Aquilo lhe perturbava a não-vida humana, e o seu compromisso era a elevação da alma pelo pecado. Ele desejava pecar no interior dela. Injetar a pouca prova do que representava o amor em seu perfume de defunto. A voz daquela criatura era um grito morto, mais aborto do que feto. No entanto havia nele ainda um medo estigmatizado, toda a fúria era isso, o medo. Mas o que o amedrontava? Sim, a mulher o amedrontava.
Ela era um tipo de olhar que sufocava e lhe deixava em paz de qualquer forma. Era feita de cores sujas, mesmo sendo pálida por dentro e por fora. Sua alma estava envolta pelo tormento que ela sugara da placenta estragada da criadora. Tudo permanecera durante aquele tempo em caos absoluto. De um lado se tinha a paixão, do outro o amor; fúria e calma; medo e coragem; violência e poesia; sexo e ternura; morte e vida.
Existindo de maneira estarrecedora, tudo se transformara em carne e em lamento. TUDO se passara DENTRO dela. TUDO estava nela e era ELA, a menina.
(Teresa Coelho)
22/04/2010

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