quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Uma Parte

-- Paralisada, disse ela para as mãos. – Se mexam! Se mexam! Implorou com certa conformidade no tom de voz. A menina dos cachos quebrados ficou sozinha na calçada da rua esburacada e escura. Guardava dentro dela um segredo que nem ela mesma lembrava se era verdade ou vontade de ser. Mas o que queria aquela criatura desnutrida de sonhos, parada numa rua desconhecida? Ela crescera lá. E crescera no interior de sua infância uma coisa crua e sem cor, sem muitas lembranças práticas... Não tinha culpa se não se lembrava das coisas significativas. Todavia, o que poderia ser mais significativo do que não saber pela primeira vez que não é preciso comparar flores e estrelas? Os sapos começavam a morrer na estrada, o vento gélido e úmido endurecia a saia e arrepiava de alguma forma mágica cada poro de suas coxas brancas e sem vida. Abaixou a cabeça por um momento e percebeu seus pés afundarem na areia que ia arranhando gradualmente suas feridas encobertas pelo tempo. No silêncio do desconhecido é que ela pudera reconhecer suas verdadeiras coisas: o ritmo da respiração; o gosto de sangue na língua; a testa quente; o relógio atrasado; o peso nos olhos; o cansaço dos ombros; o descaso às coisas complexas; a bagunça da sua história. Só que sem perceber suas mãos começaram a se mexer. Ela acordou para fora e berrou feito um animal ferido:
--Mãe, eu ainda tenho vida!

(Teresa Coelho)
09/09/2010

5 comentários:

  1. Os bons escritores recebem elogios assim:
    CAARAAALHOOOOOOO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
    :0 PASSADA...ASSADA E RECOLHIDA.

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  2. JURO que a cada texto novo que eu leio, eu te amo mais, te admiro mais como escritora e pessoa. ♥

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  3. faço minhas as palavras de Safy!! te amo teresa tu é demais véi!!

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